domingo, 28 de outubro de 2007

Fortaleza de Ormuz

Fortaleza Portuguesa de Ormuz (gravura do séc.XVI)
Cidade estratégica situada à entrada do Golfo Pérsico, foi conquista por Afonso de Albuquerque em 1515, onde estabeleceu uma poderosa fortaleza (Forte Nossa Senhora da Vitória), a que se seguiram outras importantes construções. A conquista abria aos Portugueses os mercados da Pérsia e controlava uma das principais vias do comércio muçulmano.
Com a dominação espanhola de Portugal (1580-1640), Ormuz fica particularmente vulnerável, à semelhança do que aconteceu a outras possessões e fortalezas portuguesas no mundo.
No século XVII, os ingleses aliando-se aos persas (muçulmanos), conquistam Ormuz em 1622, após um longo cerco.

Ormuz

A 26 de Março lançaram ferro no porto de Ormuz (...) Era agora valido do rei de Ormuz Raez Hamede...
Afonso de Albuquerque mandou-lhe dizer (...) que "lhe entregasse a fortaleza que ali deixou começada e lhe enviasse os seus governadores com o contrato da entrega que pouco antes o rei Ceifadim lhe fez daquele reino por isso ser necessário ao que havia de combinar-se" (...). Veio o governador Raez Nordim com um sobrinho e, tendo concedido tudo, deu-lhes Afonso algumas peças de honra e preço, e por ele mandou ao rei um colar de ouro não menos valioso por obra do que por matéria. Levou também uma bandeira em que se viam as armas de Portugal para que, desfraldando-a, em lugar alto, constasse por ela a paz estabelecida entre uns e outros. Celebrou-se o acto com artilharia e trombetas de ambas as partes, em testemunho de alegria comum. No domingo de Ramos tomou Albuquerque posse da fortaleza começada, que em poucos dias cresceu muito, e, com alguns capitães, passou às casas que estavam perto (...). Assim ficou aquele rico e formoso reino inteiramente sob a mão portuguesa, antes aumentado que diminuído em relação aos seus próprios reis, pois muito mais lhe levavam as tiranias de seus ministros do que representava o novo tributo com que a reconheciam. Juntava-se a este benefício a segurança que de novo lhes ficava com as nossas armas e o temor delas em toda a Ásia, senão quanto à liberdade sujeita que todas as comodidades faz parecer pequenas.»

Manuel de Faria e Sousa, Epítome de las Historias Portuguesas (1628)

Conquista de Malaca (1511)

Malaca, porto estratégico no comércio do Extremo Oriente.
Conquistada por Afonso de Albuquerque, em 1511, aí convergiam
as rotas do cravo das Molucas, da noz moscada de Samatra, das
sedas e porcelanas da China.

sábado, 27 de outubro de 2007

Malaca

"Desejava el-rei D. Manuel com empenho, e disso encarregou Afonso com insistência, dominar a cidade de Adém e edificar ali uma fortaleza. Achava-se ele com Goa tomada, e em estado que já se acusava ele a si mesmo de estar faltando a outras empresas. Fingiu que tentava passar a esta, despachando alguns capitães para várias partes e a principal no mar Vermelho, onde está aquela cidade, sendo o seu intento aparecer em Malaca (...). Saiu de Cochim para Malaca a 2 de Maio com 19 baixéis (...), ganhou na viagem, em frente de Ceilão, cinco naus de mouros que passavam a Malaca (...) três juncos mais adiante correram a mesma sorte. Pela gente de um deles teve notícia das coisas de Malaca, em cujo porto surgiu a nossa armada no primeiro de Julho, ao som de instrumentos e de artilharia (...) e finalmente, com grandes perdas do inimigo, toma inteira posse da cidade, apenas com a coragem de 800 portugueses e de 200 malabares. Pelo espaço de nove dias acabaram de ser mortos naquela praça e expulso dela os mouros. Sucederam-lhe os estrangeiros a povoá-la e também alguns naturais malaios, por Albuquerque lhes haver concedido licença."

Manuel de Faria e Sousa, Epítome de las Historias Portuguesas (1628)

Goa

Goa, nos finais do século XVI.
Goa, a capital do estado da Índia, era um grande centro comercial e lugar de encontro de várias raças.

Conquista de Goa (1510)

"Temos (...) o grande Afonso de Albuquerque fundeado na barra de Goa, e é mister que vejamos o que fez (...). Investia Albuquerque a entrada no outro dia, quando chegou a Miralé com pessoas gradas da cidade, oferecendo-lhe da parte de seus principais uma boa paz a troco de assegurar as vidas, o sossego, a liberdade e os haveres (...). Aceitou Afonso de Albuquerque o oferecimento, e, aparecendo em frente da cidade a 17 de Fevereiro, foi recebido na praia como se fosse seu natural príncipe. Montando um cavalo, que lhe ofereceram, ajaezado a seu modo, chegou às portas, onde lhe entregaram as chaves, com que foi caminhando até às sumptuosas casas que haviam sido do Sabaio".

Manuel de Faria e Sousa, Epítome de las Historias Portuguesas (1628)

1510: conquista de Goa. A cidade veio a ser a capital do Império Português do Oriente.

A conquista de praças estratégicas da Índia

"Se a Nosso Senhor aprouver que o negócio da Índia se disponha em tal maneira que o bem e riquezas que nela há vão cada ano em vossas frotas, não creio que na cristandade haverá rei tão rico como Vossa Alteza. Portanto, digo, Senhor, que aguenteis o feito da Índia, mui fortemente com gente e armas, e que vos façais forte nela e segureis vossos tratos e vossas feitorias, e que arranqueis as riquezas da Índia e trato das mãos dos mouros, e tirar-vos-ei de grandes despesas, e segurareis vosso Estado na Índia, e havereis todo o bem e riquezas que nele há e seja com tempo."

Carta de Afonso de Albuquerque ao Rei D. Manuel I (1510)

Em 1509 Afonso de Albuquerque é nomeado 2.º vice-rei da Índia.

O domínio dos mares da Índia

"Toda a nossa força seja no mar. Desistamos de nos apropriar da terra. As tradições antigas de conquista, o império sobre reinos tão distantes não convém [...] Com as nossas esquadras teremos seguro o mar e protegidos os indígenas, em cujo nome reinaremos de facto sobre a Índia. Se o que queremos são os produtos dela, o nosso império marítimo assegurará o monopólio português contra o turco e o veneziano. Impunhamos pesados tributos, exageremos os preços das licenças para as naus dos mouros navegarem nos mares da Índia e isso os expulsará [...] não é mal decerto, que tenhamos algumas fortalezas ao longo das costas, mas somente para proteger as feitorias.[...]"

Carta de D. Francisco de Almeida a D. Manuel (1508)
Em 1505 foi nomeado o primeiro Vice-Rei da Índia, D. Francisco de Almeida. Partiu para a Índia com uma armada de 15 naus e 6 caravelas com 1500 homens de armas.

Pimenteira

Pimenteira (especiaria).
Desenho do franciscano André Thevet (1502-1590), "Cosmographie".

Canela

Canela (especiaria)
Desenho de finais do séc. XVI, princípios do séc. XVII.

As riquezas da Índia

"Da Índia Oriental [...] vem pimenta [...] gengibre [...] cânfora [...] canela [...] e toda a variedade de perfumes [...] ébano, pedras preciosas de toda a espécie, pérolas, vasos de oiro e prata admiravelmente trabalhados, panos de seda e oiro, de algodão [...] loiças feitas com arte admirável a que se chamam porcelana [...] de lá vieram também cinco ou seis elefantes em tempo de El-Rei D. Manuel, o Venturoso [...]"

Damião de Góis

Portugueses e Muçulmanos no oceano Índico

"Entendendo os mouros que a nossa entrada naquelas partes tinha por fim chamarmos a nós o comércio das especiarias, que antes lhes pertencia e os fazia tão poderosos, decidiram impedir que entrássemos e nos fixássemos em qualquer parte da Índia. Uniram-se, por isso, para nossa destruição e tudo fizeram para que os reis daquelas partes nos não deixassem entrar nos seus portos, nem fizessem connosco nenhum tipo de comércio, de paz ou de amizade (...).
Vendo pois el-rei D. Manuel esse ódio grande dos Mouros contra nós (...), ordenou que, além das naus que haviam de regressar com a carga das especiarias, fosse também uma forte armada de navios e gente de armas. Mandou também um Governador para que ficasse na Índia e aí residisse para proteger os nossos amigos aliados e as feitorias que aí tínhamos e impedir o comércio dos ditos Mouros nossos inimigos."

Livro das Cidades e Fortalezas da Índia. Manuscrito de 1582

A armada de Vasco da Gama (1498)

Fonte: palma1.no.sapo.pt/rotas.htm

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Vasco da Gama


Vasco da Gama nasceu em Sines, cerca de 1469 (?), numa família nobre. Foi o capitão-mor da armada que, em 1497-98, descobriu o caminho marítimo para a Índia. Como recompensa, D. Manuel I nomeou-o almirante-mor do mar da Índia, com direito a "Dom". Voltou ao Oriente em 1502, à frente de uma grande armada e, outra vez, em 1524, como conde da Vidigueira e nomeado governador e vice-rei da Índia. Morreu em Cochim, três meses depois de tomar posse deste cargo. O túmulo de Vasco da Gama encontra-se no Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa.

Viagem de Vasco da Gama (1498): rotas

Viagem de Vasco da Gama à Índia.
Rota da Ida e do Regresso

Recepção dos Portugueses em Calecute

"Ao tempo que Vasco da Gama chegou a esta cidade de Calecut [...] mandou a terra o piloto mouro e um degradado, participando a El-Rei a sua chegada e [...] pedindo-lhe que lhe mandasse dizer quando o podia receber [...]Havida esta licença [...] entraram todos numa grande casa térrea, em que estava aquele grande Samorim da província de Malabar.[...] o qual estava em uma sala grande. O chão desta sala era todo coberto de veludo verde e as paredes armadas de panos de seda e ouro de cores. El-Rei estava num leito coberto de um pano de seda branca e ouro, bem lavrado. Era homem de meia idade, baço, alto de corpo e de bom parecer e vestido com um pano lustroso de algodão com rosas de ouro na cabeça, uma carapuça de brocado alta cheia de pérolas e pedrarias. Tinha penduradas nas orelhas arrecadas e nos dedos dos pés e mãos muitos anéis [...] tudo de pérolas e pedraria de muito valor. Vasco da Gama nestas palavras resumiu o que lhe era mandado: "Que era a causa principal que movera El-Rei seu senhor a enviá-lo àquelas partes orientais [...] fora ser muito celebrada a fama da sua real pessoa e da grandeza do seu senhorio [...] e estarem em seu poder a maior parte das especiarias que, por mão dos mouros se navegavam para todas as partes da cristandade, e por que ele tinha descoberto novo caminho para entre eles haver amizade e comércio."Os Mouros que estavam naquela cidade de Calecut por razão do comércio das especiarias, do qual negócio eram senhores, quando viram que a embaixada de Vasco da Gama era a fim do comércio destas especiarias ficaram muito tristes"

João de Barros; "Décadas da Ásia"

Chegada dos Portugueses à Índia

"No domingo (20 de Maio de 1498) fomos na direcção de umas montanhas que estão sobre a cidade de Calecute e o piloto (muçulmano) que levávamos as conheceu e nos disse que aquela era a terra onde nós desejávamos ir.
E ao outro dia, o capitão-mor mandou um dos seus homens a Calecute, o qual foi ter onde estavam dois mouros de Tunes, que sabiam falar castelhano e genovês. E o primeiro cumprimento que lhe deram foi este:
_ O diabo que te carregue; quem te trouxe cá?
E perguntaram-lhe o que vínhamos buscar tão longe. E ele respondeu:
_ vimos buscar cristãos e especiarias (...)
Então (...) deram-lhe de comer pão de trigo com mel. E depois de comer veio para os navios e trouxe com ele um daqueles mouros, o qual, logo que chegou aos navios, começou por dizer estas palavras:
_ (...) Muitos rubis, muitas esmeraldas. Muitas graças deveis dar a Deus, por vos trazer a terra onde há tanta riqueza.
Álvaro Velho, "Roteiro da 1.ª viagem de Vasco da Gama", 1498.

Partida da armada de Vasco da Gama (1497)

"Pelo grande desejo que El-rei D. João II sempre teve do descobrimento da Índia, no que muito tinha feito e descoberto até além do Cabo da Boa Esperança, tinha pronta a armada para descobri-la e por capitão-mor dela Vasco da Gama, fidalgo de sua casa, e por falecimento de El-Rei a dita armada não partiu.E El-Rei D. Manuel, logo que reinou, mandou partir a dita armada, assim como estava preparada, pela mesma ordenança, e os mesmos regimentos que estavam feitos, e por capitão o mesmo Vasco da Gama [...] que com a ajuda de Deus e seu esforço como valente cavaleiro, com grandes perigos e trabalhos a descobriu."

Garcia de Resende, "Crónica de D. João II"

domingo, 21 de outubro de 2007

Tratado de Tordesilhas (1494)

"[...] Na vila de Tordesilhas, aos sete dias do mês de Junho, ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1494 [...] o dito senhor Rei de Portugal [...] com os ditos senhores Rei e Rainha de Castela e Aragão [...] outorgaram e consentiram que se trace e assinale pelo dito mar oceano, uma raia ou linha direita de pólo a pólo [...] a 370 léguas das ilhas de Cabo Verde para a parte poente [...] e que tudo o que aí for achado e descoberto desde a dita raia e linha para a parte levante [...] que tudo seja e fique pertença do dito senhor rei de Portugal e de seus sucessores [...] e que tudo o resto desde a dita raia [...] indo pela parte poente [...] fique pertença dos senhores rei e rainha de Castela e Leão e a seus sucessores para sempre [...]."

Tratado de Tordesilhas, Chancelaria de D. João II
Por este tratado, o mundo foi dividido em duas grandes áreas de navegação e comércio exclusivas de Portugal e de Espanha.
Portugal tinha direito às terras descobertas e a descobrir a oriente de um meridiano que passava a 370 léguas a oeste de Cabo Verde; à Espanha cabiam as terras situadas a ocidente desse meridiano.

1492 - Cristóvão Colombo

1492, Cristóvão Colombo

Título
1492, Cristóvão Colombo (1992)
Direcção
Ridley Scott
Elenco
Gerard Depardieu, Sigourney Weaver, Armand Assante, Angela Molina, Fernando Rey, Tcheky Kario
Tempo
150 minutos

Resumo
A ambição do piloto genovês Cristóvão Colombo pelas viagens e descobrimentos, levou-o à procura de apoios para a concretização do seu sonho: descobrir uma nova rota para a Índia. Depois de ter sido mal sucedido em Portugal, conseguiu esse apoio junto dos Reis Católicos.
Em 1492, Colombo ruma ao Oriente por Ocidente, atingindo o arquipélago das Antilhas. Essa viagem é o cenário épico do filme, que retrata o dia-a-dia desgastante da vida a bordo, os motins da tripulação e a incerteza da expedição quanto ao rumo e à sua continuação.
O filme aborda, ainda, o espírito vanguardista de Colombo, as suas negociações com os Reis Católicos e a tentativa de estabelecer colónias na América.
Contexto histórico
A viagem de Cristóvão Colombo insere-se no movimento de expansão ultramarina levada a cabo por Portugal e Espanha nos séculos XV e XVI. Então, a expansão marítima ibérica visava atingir as "Índias Orientais" (terra das especiarias) para atender às necessidades de ampliação dos seus mercados e para combater, o monopólio comercial italiano no Oriente.
O problema da descoberta de um novo caminho para a Índia agudizou-se e tornou-se urgente para os europeus quando, em meados do século XV, os Turcos conquistaram Constantinopla. Ora, no último quartel do século XV, quando Colombo procurou o apoio da Coroa de Portugal, já D. João II tinha em franco desenvolvimento o plano de atingir a Índia - por mar (o navegador Bartolomeu Dias) e por terra (Afonso de Paiva e Pêro da Covilhã), o rei obtém informações seguras quanto à realização, bem sucedida, de uma expedição marítima à Índia.
A chegada de Colombo às "Índias Orientais" em 1492 levantou o problema da posse e/ou partilha das áreas de descoberta e comércio no Atlântico, o que veio a ser resolvido, logo em 1994, pelo Tratado de Tordesilhas.

In, Barreira, Aníbal; Sinais da História 8, 2007, p. 53.

Chegada de Cristóvão Colombo à América

"Em setenta e um dias, cheguei às Índias e encontrei numerosas ilhas de que tomei posse em nome de suas Altezas, sem deparar com qualquer oposição (...). Os habitantes de todas estas ilhas mostram-se de uma simplicidade e de uma generosidade tais que custa a acreditar. nunca recusam nada que se lhes peça e ficam contentes, com tudo o que se lhes oferece. Presenteei-os com mil insignificâncias vistosas para que gostassem de nós; ficarão deste modo inclinados a tornarem-se cristãos e dar-nos-ão de boa vontade o que possuem em abundância (...). Na ilha Hispaniola (1) existe bastante ouro, (...) especiarias e algodão (...) e igualmente se poderão apanhar escravos.

Cristóvão Colombo, Carta aos Reis de Espanha. 4 de Março de 1493
Depois de D. João II ter recusado o seu projecto de chegar à Índia por Ocidente, Colombo foi apoiado pelos reis de Espanha. A 12 de Outubro de 1492 atingiu a ilha de S. Salvador (nas Bahamas, Antilhas), pensando ter chegado ao Extremo Oriente.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Viagem de Pêro da Covilhã e Afonso de Paiva ao Oriente

"El-Rei D. João II falou em grande segredo dizendo que esperava dele, Pero da Covilhã, um grande serviço; o qual serviço era que ele e outro companheiro, Afonso de Paiva, lhe haverem de saber onde acham a canela e as outras especiarias que daquelas partes iam a Veneza por terras de Mouros.E partindo a 7 de Maio de 1487 foram ter a Barcelona e dali a Nápoles. E por passarem como mercadores compraram muito mel e outras mercadorias e se foram ao Cairo. Afonso de Paiva foi para a Etiópia e Pero da Covilhã para a Índia. E foi a Calecut e a Goa e a Ormuz e tornou ao Cairo.E logo aí, Pero da Covilhã, escreveu como tinha descoberto a canela e a pimenta na cidade de Calecut e que o cravo vinha de fora, mas que tudo ali havia. E que se poderia bem navegar vindo à costa de Sofala e dali à costa de Calecut."

Padre Francisco Álvares, "Informação das Terras do Preste João"
O objectivo desta viagem era a recolha de informações sobre a navegação e o comércio no oceano Índico.

Bartolomeu Dias

De 1487 a 1488, comandando uma frota de duas caravelas e uma naveta com mantimentos, descobriu a passagem do Atlântico para o Índico, dobrando o cabo da Boa Esperança. Assinalando a viagem assentou três padrões, de que restam apenas fragmentos. Em 1497 acompanhou a armada de Vasco da Gama até Cabo Verde, rumando depois para o seu destino, que era a Mina. Em 1500, comandando uma caravela na armada de Pedro Álvares Cabral, morreu ao dobrar de novo o cabo que imortalizaria o seu nome. O seu navio e mais três naufragaram devido ao violento temporal.

Rota de Bartolomeu Dias

Rota seguida por Bartolomeu Dias, que permitiu dobrar
o Cabo da Boa Esperança (1488)

Passagem do Cabo da Boa Esperança (1488)

"Bartolomeu Dias deteve-se cinco dias na Angra das Voltas. Partidos daqui, o mau tempo os fez correr treze dias, e vieram demandar a terra do rumo de leste. Porém, vendo que alguns dias navegavam sem dar com ela, carregaram sobre o rumo norte com que vieram ter a uma angra a que chamam dos Vaqueiros. A gente vinha cansada e requereu que não passassem mais avante.Partidos dali, houveram vista daquele grande e notável cabo, ao qual por causa dos perigos e tormentas em o dobrar lhe puseram o nome de Tormentoso, mas el-rei D. João II lhe chamou cabo da Boa Esperança, por aquilo que prometia para o descobrimento da Índia tão desejada.

João de Barros, "Décadas da Asia"

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Diogo Cão

O navegador português, Diogo Cão realizou duas viagens de descobrimento da costa sudoeste africana: na primeira (1482-1484), chegou à foz do rio Zaire e avançou pelo interior do rio, tendo deixado uma inscrição comprovando a sua chegada à catarata de lelala; na segunda (1485-86) estabeleceu as primeiras relações com o Rei do Congo, cujo reino visitou. Nessas viagens deixou padrões de pedra como testemunho da presença portuguesa.

Viagem de descoberta do rio Zaire à Serra Parda (1485)

"Chegado Diogo Cão ao Congo foi recebido pelos da terra com muito prazer vendo os seus naturais que ele trouxera vivos e tão bem tratados os que levara, pedindo-lhes Diogo Cão em troca os portugueses que lá tinham ficado.El-Rei do Congo mandou a El-rei (D. João II) por seu embaixador Caçuta, homem muito importante que depois de ser cristão teve o nome de D. João Silva, e alguns moços, com um presente de muitos dentes de elefante e cousas de marfim lavradas e muitos panos de palma bem tecidos e com finas cores por em sua terra não haver outras coisas.E lhe pedia que lhe mandasse logo frades e clérigos e todas as coisas necessárias para ele e os seus receberem água do baptismo. E assim lhe mandasse pedreiros e carpinteiros para lhes fazerem igrejas [...] e também lhe mandasse lavradores para lhe domesticarem bois e lhe ensinarem a aproveitar a terra, e assim algumas mulheres para ensinarem as do seu reino a amassar o pão, porque ficaria muito contente que as coisas do seu reino se parecessem com as de Portugal. [...] E lhe pedia por mercê que certos moços pequenos do seu reino que lhe mandava os mandasse logo fazer cristãos e ensinar a ler e a escrever. [...] El-Rei D. João [...] estando em Beja, levou o embaixador Caçuta à pia baptismal para o fazer cristão e assim aos moços que com ele vieram, e a Rainha foi a madrinha, vestindo-se ela e El-Rei de festa.

"Garcia de Resende, "Crónica de D. João II"
Nesta segunda viagem Diogo Cão explorou a costa africana para sul do rio Zaire até à Serra Parda.

Os Padrões dos Descobrimentos

Diogo Cão colocando um Padrão na foz do rio Zaire
Diogo Cão introduziu a utilização dos padrões de pedra, em lugar das cruzes de madeira, para assinalar a presença portuguesa nas terras descobertas. Os padrões são pilares de pedra com uma cruz em cima e com as armas reais gravadas.

Viagem e descoberta do Rio Zaire

"[...] D. João II, desejando o descobrimento da India e Guiné que o Infante D. Henrique seu tio, primeiro começou, mandou a sua frota à dita costa, e por capitão-mor dela mandou Diogo Cão, cavaleiro de sua casa [...][...] O qual indo pela dita costa foi ter ao rio Congo que é um dos grandes que no mundo se sabe de água doce [...] Diogo Cão determinou mandar ao rei da terra um presente e mandou-lhe dizer que a armada era do rei de Portugal que com todo o mundo tinha paz e amizade [...] Chegaram ao rei do Congo e foram por ele recebidos com muita honra muito prazer e alegria e espanto e folgou tanto de os ver e perguntou-lhes pelas coisas de cá que os não podia despedir de si e deixá-los tornar à frota.E pela muita tardança sua pareceu ao capitão que deviam estar cativos ou mortos. E vendo que os negros de terra se fiavam dele e entravam já nos navios, determinou não esperar os que mandara, e partir-se com alguns daqueles negros, e assim fez. E se veio com eles para Portugal, não os trazendo como cativos mas com fundamento que, depois de aprenderem a língua e os costumes nossos, tornariam ao Congo ".

Garcia de Resende, "Crónica de D. João II"

A Costa da Mina

Costa da Mina (1546)
1482: ano da fundação da fortaleza de S. Jorge da Mina.
Em 1481 realizou-se uma viagem de exploração à Mina, o objectivo era fundar a Fortaleza de S. Jorge da Mina. O primeiro feitor da Mina foi Diogo de Azambuja, cavaleiro da Ordem de Avis. O rei D. João II encarregou-o de edificar o Castelo-feitoria de S. Jorge da Mina (1481-1482) que ficou a administrar até 1484.

domingo, 14 de outubro de 2007

Gil Eanes

Navegador português que em 1434 dobra o cabo Bojador

Descoberta das Ilhas de Cabo Verde

"Neste mesmo tempo [...] se descobriram as ilhas a que hora chamamos de Cabo Verde, por um António de Nolle, genovês de nação e homem nobre, que [...] veio a este reino com duas naus e um barinel, em companhia do qual vinha um [...] seu irmão e um [...] seu sobrinho. Aos quais o infante deu licença que fossem descobrir e do dia que partiram da cidade de Lisboa a dezasseis dias foram ter à ilha de Maio; à qual puseram este nome porque a viram em tal dia. E [...] descobriram as outras [...] que por todas são dez, chamadas por comum nome ilhas de Cabo Verde por estarem ao poente dele por distância de cem léguas [...]."
João de Barros, "Décadas da Ásia"
As ilhas de Cabo Verde, descobertas por Luís Cadamosto, Diogo Gomes e António Noli, entre 1456 e 1460, foram divididas em capitanias. O povoamento, entregue aos capitães-donatários, foi feito predominantemen-te com escravos, provenientes da costa africana, e mouros cativos.
A exploração económica teve como base a cultura da cana-de-açúcar, do algodão, do milho e a criação de gado caprino.

Feitoria de Arguim

Feitoria de Arguim representada no
Atlas de Sebastião Lopes, séc. XVI.

Fortaleza de Arguim

"O Senhor Infante fez nesta Ilha de Arguim um contrato por dez anos deste modo: que ninguém pudesse entrar no golfo de Arguim para comerciar com os árabes [...] o qual Infante tem uma feitoria na dita ilha e feitores que compram e vendem àqueles árabes [...] dando-lhes diversas mercadorias como são panos [...] prata[...] e sobretudo trigo [...] e recebem em troca negros que os árabes trazem da Nigéria, e ouro; de modo que este senhor Infante faz actualmente trabalhar em uma fortaleza da dita ilha para conservar este comércio para sempre.E por esta razão, todos os anos vão e vêm caravelas de Portugal à ilha de Arguim [...] de modo que se trazem para Portugal setecentos e oitocentos escravos."

Cadamosto, "Navegação Primeira de Uso di Mare"(Adaptado)

Povoamento dos Açores (1439)

"A quantos esta carta virem fazemos saber que o Infante D. Henrique, meu tio, nos enviou dizer que ele mandara lançar ovelhas nas ilhas dos Açores e que, se nos aprouvesse, as mandaria povoar. E porque a nós isso apraz, lhe damos a nós licença que as mande povoar.(...)Dada em a cidade de Lisboa a 2 dias do mês de Julho do ano de 1439 do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo."
Carta de D. Afonso V a Gonçalo Velho Cabral, fidalgo da casa do Infante, confiando-lhe o povoamento do Arquipélago dos Açores.
"Chegando à primeira lançaram ali muitos animais tais como porcos, vacas, ovelhas, etc.Foram depois à ilha de S. Miguel, lançaram aí igualmente porcos, vacas, ovelhas, dos quais há aí uma multidão, de modo que todos os anos daí trazem gado para Portugal.Igualmente há aí tanta quantidade de trigo que todos os anos ali vão navios e trazem trigo para Portugal."
Diogo Gomes, "A Relação dos Descobrimentos da Guiné e das Ilhas"(Adaptado)

Descoberta do Rio do Ouro e Pedra da Galé (1436)

"E navegando por sua viagem chegou a [...] uma foz como se fosse de rio.[...] E porque entre as coisas que Afonso Baldaia levava assim eram dois cavalos [...] fê-los logo pôr em terra e mandou aos moços que cavalgassem naqueles cavalos e fossem por terra quanto pudessem [...] Partiram com grande esforço, seguindo ao longo daquele rio por espaço de sete léguas, onde acharam 19 homens todos juntos [...] mas aquela gente não conhecida acolheu-se a uns rochedos onde estiveram pelejando com os moços por bom espaço [...] até que o Sol começou a mostrar os sinais da noite, por cuja razão se tomaram a seu navio."

Gomes Eanes de Zurara, "Crónica da Guiné"(Adaptado)

Açores

Representação do arquipélago dos Açores,
no "Libro di Benedetto Bordone...", Veneza, 1528.

Descoberta dos Açores

"[...] Viram terra a ocidente além do cabo Finisterra uma trezentas léguas que eram ilhas, entraram na primeira desabitada e acharam muitos açores e muitas árvores; e foram à segunda que era chamada ilha de S. Miguel, também despovoada e com muitas árvores e açores, onde além disto encontraram muitas águas quentes naturais de enxofre. Daí viram outra ilha agora chamada Terceira [...] cheia de arvoredos e muitos açores. E descobriram ali perto outra ilha, agora chamada Faial. E imediatamente outra ilha a duas léguas da ilha do Faial, agora chamada ilha do Pico; esta ilha é um monte de sete léguas de altura [...] Os navios voltaram a Portugal, anunciando a notícia ao senhor D. Henrique que se alegrou muito."

Diogo Gomes, "A Relação dos Descobrimentos da Guiné e das Ilhas"(Adaptado)

Madeira

Desenho da ilha da Madeira no chamado
"Manuscrito Valentim Fernandes", (c. 1506-1510).

Descoberta da Ilha da Madeira

"Pouco tempo depois mandou o Senhor Infante uma caravela para visitar a ilha descoberta de Porto Santo [...] E passaram além directamente à ilha chamada da Madeira [...]. Estava toda cheia de árvores, cedros e outras espécies.[...].Não muito tempo depois, um cavaleiro [...] de nome João Gonçalves Zarco pediu a Capitania daquela ilha ao Senhor Infante, dizendo que iria para ali com sua mulher e família e a povoaria. Agradou isto ao senhor Infante e preparou caravela, mandando porcos, ovelhas e outros animais domésticos [...] Começaram a semear trigo e aveia e era tão fértil o solo que uma medida dava cinquenta e mais [...]Pouco tempo depois um cavaleiro de nome Tristão pediu ao senhor Infante, que lhe desse a outra parte da ilha da Madeira [...] E ficou a ilha repartida assim: a parte ocidental, Funchal, ficou para João Gonçalves Zarco a qual é muito fértil e onde há trigo com fartura, óptimo vinho, canas-de-açúcar, de que fabricam açúcar em tal quantidade que é exportado [...] A parte oriental da ilha, Machico, ficou pertencendo a Tristão Teixeira onde também cresce tudo o que se disse [...]."
Diogo Gomes, "A Relação dos Descobrimentos da Guiné e das Ilhas"(Adaptado)

Ceuta

Ceuta, numa gravura de "Civitates Orbis Terrarum"
de Georgius Braunius e Franz Hohemberg,
vol. I, Colónia, 1572.

Conquista de Ceuta

"[...] Vendo El-Rei seus filhos em idade para tomarem a ordem da cavalaria, determinou fazer todo um ano festas e justas e torneios [...] mas os infantes não se satisfaziam com isto [...]. Estando os Infantes [...] tratando um dia desta matéria, e dando disso parte a João Afonso, vedor da fazenda d'El-Rei [...] lhes disse que se tal vontade tinham lhes indicaria uma coisa em que eles bem e honradamente pudessem mostrar que eram filhos de seu pai e que aquilo era a cidade de Ceuta que tanto mal fazia aos cristãos que passavam o Estreito [...]Os infantes [...] se entusiasmaram tanto que logo o propuseram a El-Rei."
Duarte Nunes de Leão, "Crónica de D. João I"(Adaptado)
"Piedosa coisa era ouvir os gemidos daqueles mouros depois que foram afastados da sombra dos muros da sua cidade [...] chorando a sua perdição [...]- Oh! diziam eles, cidade de Ceuta, flor de todas as outras da terra de África! Onde acharão os teus moradores [...] daqui em diante, os mouros estranhos que vinham da Etiópia e de Alexandria [...] e das Índias e doutras muitas terras [...] cansados de tantas e tão ricas mercadorias? Onde acharão eles outro lugar semelhante onde possam lançar suas âncoras? [...] Quais de nós acharão agora, quando se levantarem das suas casas, as bestas carregadas de seda que nos vinha da cidade de Damasco ou as casas cheias de pedras preciosas das da comunidade de Veneza, ou os grandes sacos de especiaria que nos vinham dos desertos da Líbia? [...]"
Gomes Eanes de Zurara, "Crónica da Tomada de Ceuta"(Adaptado)

sábado, 13 de outubro de 2007

A Ilha de S. Tomé

Habitam na ilha de S.Tomé muitos comerciantes portugueses, castelhanos, franceses e genoveses […]. E todos têm mulher e filhos e às vezes acontece que, morrendo-lhes as mulheres brancas, as tomam negras […]. O principal negócio dos habitantes é fabricar açúcar e vendê-lo aos navios que todos os anos o vêm buscar. […] Cada habitante compra escravos negros, com as suas negras, da Guiné, Benim ou Congo e põe estes casais a lavrar a terra, para plantar e fazer o açúcar. E há homens ricos que possuem 150, 200 e até 300 escravos, os quais têm obrigação de trabalhar toda a semana para o seu senhor, excepto aos sábados, em que trabalham no cultivo dos víveres de que se alimentam.

Navegação de Lisboa à ilha de S.Tomé. C. 1540

Construção da fortaleza de S. Jorge da Mina

El-rei D. João II, porque já em vida d'el-rei D. Afonso V, seu pai, tinha a seu cargo o negócio da Guiné(1), sabia, por experiência dele, como daí vinham ouro, marfim, escravos e outras coisas que enriqueciam o seu reino. Por outro lado, cada ano se descobriam novas terras e povos, pelo que a esperança do descobrimento da Índia por estes mares se acendia mais nele. E sabendo que na terra onde se fazia o resgate do ouro, os negros aceitavam com satisfação panos de seda, de lã, de linho e outras coisas […] ordenou que a fortaleza de S. Jorge da Mina se fizesse em aquele lugar onde os nossos ordinariamente faziam o resgate do ouro.

João de Barros, Ásia

(1) Designava-se por Guiné toda a costa africana.

A chegada dos primeiros escravos africanos a Portugal (1441)

Chegaram as caravelas a Lagos, de onde haviam partido […]. No outro dia começaram os marinheiros a tirar os escravos que tinham trazido para os levarem segundo lhes fora mandado […].
Qual seria o coração, por duro que pudesse ser, que não ficasse cheio de piedoso sofrimento, vendo a situação daquela gente? […] Uns tinham as caras baixas e os rostos lavados em lágrimas, outros estavam gemendo dolorosamente, […] outros faziam as suas lamentações em maneira de canto segundo o costume da sua terra […]. Mas, para a sua dor ser mais acrescentada, chegaram os que estavam encarregados da partilha e começaram a apartá-los uns dos outros, a fim de fazerem lotes iguais. Para isso havia necessidade de se apartarem os filhos dos pais, as mulheres dos maridos e os irmãos uns dos outros […].
Quem poderia acabar com aquela partilha sem grande trabalho? Logo que os tinham posto numa parte, os filhos, que viam os pais na outra, levantavam-se e corriam para eles; as mães apertavam os filhos nos braços para não lhes serem tirados.
E assim os acabaram de repartir com dificuldade, pois, além do trabalho que tinham com os cativos, o campo estava cheio de gente, assim de Lagos como das aldeias em redor, que deixara aquele dia descansar as mãos em que estava a força do seu ganho,somente para ver aquela novidade. E com estas coisas que viam, uns chorando, outros falando, faziam tamanho alvoroço que estorvavam os que faziam a partilha.

Zurara, Crónica da Guiné. Séc. XV

Os primeiros contactos com os Africanos

Os nossos navios, vendo-se assaltados por aquela multidão de negros, descarregaram quatro bombardas da primeira vez. Ao ouvi-las, os Negros, aterrados pelo grande estrondo, deixaram cair os arcos e olhando uns para um lado outros para outro estavam admirados de ver as pedras disparadas pelas bombardas cortarem a água junto de si. […] Tentámos depois contactar aqueles Negros e […] então lhe perguntámos por que causa nos ofendiam, sendo nós gente pacífica e vindo tratar de mercadorias. E dissemos-lhes que tínhamos boa paz com os Negros do Senegal e que assim igualmente queríamos ter com eles; que éramos vindos de países distantes para trazer alguns presentes de valor ao seu rei e Senhor por parte do rei de Portugal, o qual desejava ter amizade e boa paz com ele; e que lhes rogávamos viessem a nós pacificamente tomar das nossas mercadorias, dando-nos das suas quanto quisessem […]. A sua resposta foi que, pelo passado, tinham alguma notícia de nós e do nosso modo de tratar com os Negros do Senegal; os quais Negros não podiam deixar de ser maus homens em querer a nossa amizade, porque eles tinham por certo que nós Cristãos comíamos carne humana e que não comprávamos os Negros senão para os comer; por isto não queriam a nossa amizade por nenhum modo.

Cadamosto, Navegações

Comércio na Costa Ocidental Africana

O senhor infante D. Henrique tinha sempre de todos os cativos que traziam uma quarta parte (…). Depois disto, no seu conselho, o Senhor Infante dizia que para o futuro não brigassem com aquela gente naquelas regiões, mas que travassem alianças, e tratassem do comércio, e com eles assentassem pazes porque a sua intenção era fazê-los cristãos (...).
Algum tempo depois o Senhor Infante armou uma caravela de Lagos, (…) e fez Diogo Gomes, capitão dela. (…) E passámos o rio de S. Domingos (…) e vieram os mouros de terra nas suas embarcações e trouxeram-nos as suas mercadorias, a saber: (…) panos de seda ou algodão, dentes de elefante e uma quarta de malagueta em grão, e nas suas cascas, tal como cresce, com o que muito me alegrei (…).
E vimos a grande foz de um rio (...) e pela grandeza logo pensámos que aquele rio era o Gâmbia, e assim era (...). No outro dia (...) vimos gentes (…) e chegámos até próximo e fizemos paz com eles (…). E aí recebi deles 180 arratéis de ouro, em troca das nossas mercadorias, a saber: pano, manilhas(1) de cobre, etc.

Diogo Gomes, Relação do Descobrimento da Guiné
(1) Argolas, pulseiras

O Contrato de Arrendamento a Fernão Gomes

Em Novembro do ano de 1469, arrendou el-rei D. Afonso V o negócio da Guiné a Fernão Gomes, um rico cidadão de Lisboa, pelo tempo de cinco anos, por duzentos mil réis cada ano. Com a condição de que em cada um desses cinco anos fosse obrigado a descobrir pela costa adiante cemléguas. […] E foi Fernão Gomes tão diligente e ditoso nesse descobrimento que logo em Janeiro de 1471 descobriu o resgate(1) de ouro a que agora chamamos a Mina.
João de Barros, Ásia

(1) Lugar onde se fazia comércio; o próprio comércio.

A passagem do Cabo Bojador

Tinha o infante D.Henrique vontade de saber que terra ficava para além das Canárias e de um cabo que se chama Bojador, porque, até aquele tempo, não se sabia a qualidade da terra que ficava além do dito cabo. […] Mandou, assim, em direcção a essas partes os seus navios, para haver de tudo manifesta certidão.[…] Mas,embora lá enviasse muitas vezes homens que tinham experiência de grandes feitos, nunca nenhum ousou passar aquele cabo Bojador […].
Depois de doze anos [de tentativas], mandou o Infante armar uma barca da qual fez capitão Gil Eanes, seu escudeiro, o qual, seguindo a viagem dos outros e tocado daquele mesmo temor, não passou das ilhas Canárias. Mas, no ano seguinte [1434],o Infante fez armar outra vez a dita barca e, chamando Gil Eanes de parte, o encarregou muito que se esforçasse para passar aquele cabo. […] De facto, Gil Eanes, desprezando todo o perigo, dobrou naquela viagem o cabo Bojador e passou além, onde achou as coisas muito ao contrário do que ele e os outros até ali presumiam.

Gomes Eanes de Zurara, Crónica da Guiné

Início do Descobrimento da Costa Africana

Mandou o senhor infante D. Henrique um cavaleiro nobre, de nome Gonçalo Velho, para além das ilhas Canárias, ao longo da beira-mar. […] O qual chegou a um lugar onde havia apenas areia e não se acharam árvores nem ervas, à qual terra de areia […] se chama Mar Arenoso [deserto do Sara]. Esse Mar Arenoso os muçulmanos do Norte de África o atravessam em caravanas, levando às vezes até 700 camelos, até um lugar chamado Tombuctu, em demanda do oiro […] que aí se encontra em grande abundância. […] O que, ouvido pelo infante D. Henrique, o
moveu a procurar, por mar, aquelas terras para ter comércio com elas e sustentar os seus nobres.


Diogo Gomes, Relação do Descobrimento da Guiné

Doação da Capitania do Funchal a João Gonçalves Zarco

Eu, o Infante Dom Henrique, (...) faço saber a quantos esta minha carta virem e o conhecimento dela pertencer que eu dou cargo a João Gonçalves Zarco, cavaleiro da minha casa, da minha ilha da Madeira da terra desde o Caniço dez passos se vai pelo ribeiro acima e daí atravessa a serra até a ponta de Tristão, que ele dito João Gonçalves a mantenha por mim com justiça e direito e morrendo ele por mim praz que seu filho primeiro ou segundo, se tal for, tenha cargo pela guisa acima dita assim (...) de descendentes por linha direita e sendo em tal idade o dito seu filho que a não possa reger Eu e os meus herdeiros poremos aí quem a reja e até que ele seja em idade para a reger.
Item me apraz que ele tenha em esta ilha a jurisdição por mim. E em meu nome do cível e crime ressalvando morte ou talhamento de membro que isto venha perante mim, porém sem embargo da dita jurisdição a mim apraz que todos meus mandados e correição sejam aí cumpridos assim como em cousa própria minha. Outrossim me apraz que o dito João Gonçalves haja para si todos os moinhos de pão que houver na dita ilha.
Outrossim me apraz que tudo o que Eu houver de renda na dita ilha que ele haja, de dez, um, e o que Eu hei-de haver na dita ilha e é contado no foral que para isto mandei fazer por esta guisa me apraz que haja esta renda seu filho ou outro descendente por linha direita que o dito cargo tiver.
Item me apraz que ele possa dar suas cartas a terra desta parte fora do foral a quem lhe aprouver, com tal condição que aquele a quem derem a dita terra a aproveite até cinco anos e não a aproveitando que a possa dar a outrem e depois que aproveitada for e a deixar por aproveitar até outros cinco anos que isso mesmo a possa dar. (...)
E por esta presente encomendo e rogo a todos os meus herdeiros e sucessores, que depois de mim vierem, hajam por firme esta minha carta e a cumpram e façam cumprir e guardar em tudo e por assim e pela guisa que nela é contido, porque Eu fiz esta mercê do dito João Gonçalves por ele ser o primeiro que, por meu mandado a dita ilha povoou e por outros muitos serviços que me fez.
"Carta de doação da capitania da ilha da Madeira (parte ocidental)",
in Silva Marques, Descobrimentos Portugueses -
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